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  • Foto do escritorLuís Henrique de Oliveira

Prioridades e ansiedade

Práticas meditativas e psicosensoriais são essenciais para trazer clareza mental, pois tornam o fluxo de pensamentos mais harmônico e ordenado. Muitas vezes nossa mente está tão agitada e confusa que nem mesmo conseguimos perceber quais questões da vida precisamos ajustar. Trabalhando há tantos anos com ajuda, pude observar que o cliente apenas se torna capaz de perceber o que verdadeiramente o aflige no momento em que um espaço interno de centramento é criado. Muitas vezes, a minha tarefa, tanto em atendimentos individuais como em grupos, é colocá-lo em um estado de maior presença, diminuindo o burburinho dos pensamentos, para que, assim, as respostas que ele precisa possam emergir. Quando não há centramento, não há solução, pois o profundo da solução depende de um continente de presença para ser acolhido e solucionado. Dessa forma, toda a solução, começa com silêncio e recolhimento.

A meditação e a presença observadora das sensações do corpo, pendulando entre constrição e expansão, são extremamente úteis para o aumento do recolhimento. Todo caminho de iluminação inclui o aprendizado e o treino da capacidade de estar presente. Recolhidos, utilizamos a nossa presença para obtermos clareza sobre o que precisamos fazer, quais são os passos de nossa solução, e como podemos estabelecer prioridades nisso. Esse é o tema do nosso texto.

O mais importante é manter o mais importante como o mais importante

Se fossemos eleger um arqui-inimigo para o nosso estado de presença, provavelmente, escolheríamos a ansiedade. Por trás da ansiedade, normalmente, encontramos duas percepções distorcidas: o receio de que o pior possa acontecer no futuro, sob influencia do qual criamos possibilidades nefastas e as cultivamos, por vezes, criando estórias terríveis para cada possibilidade que pensamos; e um fluxo de tarefas desorganizado, no qual assumimos coisas demais, paralisamos diante de tanto para fazer, ficamos sem energia para produzir, aumentando o volume de trabalho não concluído e a sensação de escassez em relação ao tempo, a percepção de pressa que torna o tempo cada vez menos suficiente para realizar o que precisamos. Nesse turbilhão, perdemos de vista o mais importante, sem perceber que justamente nossa não ação em relação ao que verdadeiramente importa é o que está drenando nossa energia criativa. Essa energia, se não drenada, permitiria-nos por em ordem a vida como um todo.

Frequentemente assumimos responsabilidades por questões que não nos competem ou que são completamente insolúveis por intermédio dos recursos que possuímos. Muitas dessas coisas também são responsáveis por roubar nossa energia criativa. Nossas tentativas de ajudar um familiar ou amigo que não quer ser ajudado, nosso desejo de mudar o nosso cônjuge, os conselhos que queremos que nossos pais aceitem, o favor que queremos prestar para um amigo que está em dificuldades, sendo que, muitas vezes, ele nem mesmo tenha pedido para ser ajudado. Quanto mais fora da nossa esfera de responsabilidade estiver o problema que assumimos como nosso, mais energia perderemos tentando solucioná-lo, sem qualquer possibilidade de um bom desfecho.

Paralisado diante de uma indecisão

Não há maior ladrão da nossa potência criativa que a indecisão. Cada área de nossa vida que nos demoramos em decidir permanece ocupando uma parte importante de nossa atenção, atraindo constantemente nossos pensamentos, como se o muito pensar fosse nos ajudar a decidir, sobrando assim pouca energia para a realização das demais atividades que nos competem.

Diariamente vejo isso em meus atendimentos, quando a esposa está em dúvidas se permanece com o marido e diminui a produtividade no trabalho ou quando o adolescente não decide qual faculdade seguir, e perde a capacidade de estudar pelo peso da indecisão. Muitas vezes o que não percebemos é que desistir de decidir pode ser a melhor opção no momento. A esposa pode reconhecer que ainda não tem condições de separar, por terem filhos pequenos, por exemplo, e que precisa desistir da separação pelos próximos 5 anos; o jovem que precisa escolher a faculdade, sua profissão durante toda a vida, precisa dar a si mesmo a chance de trabalhar um ano ou fazer um intercâmbio, e até lá deixar o que ainda não pode ser decidido de lado. O que acontece quando desistimos de tomar uma decisão sobre algo que ainda não pode ser decidido, e seguimos um pouco mais no fluxo da vida, sem brigarmos com o que é possível naquele momento, é que a resposta de decisão ou a força necessária para realizá-la simplesmente podem, então, chegar, enquanto caminhamos.

A indecisão se alimenta de uma ideia fantasiosa que possuímos uma grande liberdade, quando na verdade nossa liberdade é pequena. Chamo aqui de pequena liberdade o que nos é possível em cada momento da vida, no passo imediato que preciso dar. Diante de muitas possibilidades normalmente há apenas uma que tem força, que é fácil, que assegura a prioridade do que é prioritário, e que já possuímos todos os recursos para realizar. As outras na maior parte das vezes são ilusões, para o agora, mesmo que sejam, talvez, grandes possibilidades para o futuro, ou foram cavalos encilhados do passado, que já se foram. Reconhecer onde está a força, e decidir-se por esse caminho, sem mais titubear, é fruto de recolhimento e garante que minha presença permanecerá com energia disponível para o momento presente.

Indecisão já foi um grande tema na minha vida. Ainda preciso ficar atento para não me encantar com as possibilidades e perder tempo e energia cogitando o que, olhando para a realidade, poderia rapidamente perceber que não é pra mim, ainda. Reconhecer qual o caminho eu preciso seguir e não perder tempo pra decidir nada, me garantem muito mais energia disponível para aquilo que importa.

Querer e precisar

Minha decisão envolve algo que eu quero, ou algo que eu preciso? Na maior parte das vezes tomar essa pergunta seriamente é o suficiente pra resolver a maior parte das minhas indecisões. Estou em dúvida se compro um celular novo - mas eu quero ou preciso de um celular novo? Querer sempre diz respeito a um desejo, a uma vontade. O querer assemelha-se a nossa criança mimada que quer comprar todos os chocolates do supermercado. Tive um professor que dizia algo que aplica-se bem para o nosso querer: “orem a Deus todos os dias para que Ele não ouça as suas orações”. Aquilo que queremos, muitas vezes, são luxos supérfluos, que tantas vezes acabam nos custando caro. Somos capazes de querer inúmeras coisas totalmente desnecessárias, consequentemente, somos capazes de perder nossa paz interior com esses desejos. Já o precisar envolve, normalmente, apenas uma única coisa por vez. Precisamos daquilo que é essencial, que assegura a sobrevivência. Precisamos de amor, afeto, comida, colo, carinho, aceitação, boas conversas, sono reparador, descanso, sexo, lazer, férias, rir. As coisas que precisamos não custam

muito, são acessíveis e saciam a alma. As coisas que queremos, normalmente, trazem ainda maior “fome” depois.

Claro que isso não significa que o querer seja ruim e que devo sempre abrir mão dele. O problema do querer é quando ele nos leva a abrir mão de alguma prioridade, ou então nos afasta da realidade daquilo que é possível no momento presente. O querer desnecessário é aquele que é vazio de propósito, num contexto onde os recursos não são tão abundantes. Digamos que eu queira um carro novo, mesmo sem precisar. A próxima pergunta é se tenho dinheiro sobrando. Se a resposta for não, minha tarefa é desistir de continuar cogitando como possibilidade o que está fora de contexto para o momento. Agora se eu quiser uma bolsa nova, mesmo tendo uma ótima e tiver dinheiro sobrando para isso, esse é um querer possível.

O precisar sempre tem um bom propósito, um “para que”. Aquilo que precisamos está facilmente ao nosso alcance, mas nem sempre sem algum esforço de minha parte. Posso precisar de carinho e estar acostumado a negar-me a pedir, e mesmo tendo um cônjuge que poderia facilmente me oferecer isso, não peço. Muitas vezes aquilo que precisamos e ainda não possuímos, revela alguma teimosia em fazer as coisas do nosso jeito. E quanto menos buscamos aquilo que precisamos, mais tentamos suprir nossas necessidades com o nosso querer. O querer vem das vontades, o precisar vem do coração. O querer pode ser um tanque furado que precisa ter o furo tampado, ao invés de ser abastecido.

Por traz da maioria de nossas indecisões podemos encontrar essas duas possibilidades. Aquilo que nós queremos, e aquilo que nós precisamos. Saber reconhecer o que precisamos, e renunciar aquilo que queremos torna-se uma potência para uma vida com muito mais clareza.

Próximos passos

Em primeiro lugar vou propor que você escreva uma lista exaustiva das atuais tarefas que desempenha. Aquelas que você precisa fazer e aquelas que você faz. Também coloque nessa lista outras formas que você gasta o teu tempo, como criticando a política, por exemplo. Depois que a lista estiver pronta é hora de corajosamente começar a organizar as prioridades, buscando esclarecer:

Quais tarefas, dessas todas, realmente competem a você? Em quais delas você está envolvido em assuntos para os quais você não possui recursos, que não está diretamente envolvido na solução, ou que são responsabilidades de outras pessoas?

Com as tarefas que sobrarem, escreva um breve propósito para cada uma delas. Para que você desempenha determinada tarefa? Como cada tarefa contribui para a vida que você quer ter? Não estou dizendo que você precisa preencher todo o tempo com tarefas altamente produtivas. Lazer, por exemplo, é um bom propósito para uma tarefa.

No novo balanço, veja quais dessas tarefas possuem como propósito coisas que você precisa, e quais tarefas dizem respeito a coisas que você quer, sem nem bem saber o motivo. Veja quais dessas tantas tarefas você precisa abrir mão, para seguir com uma vida mais leve.

Com a lista daquilo que realmente cabe a você fazer, estabeleça prioridades. Gosto de começar sempre pelo mais simples e rápido - sinto que a sensação de diminuir minha lista de tarefas traz força para seguir fazendo as demais tarefas depois. Esse truque é especialmente útil quando estou com minhas obrigações atrasadas - até que eu comece, e o melhor é sempre começar pelo mais rápido e fácil, eu não tenho muita energia. Depois que tiro o primeiro item da lista já me sinto pronto para continuar até terminar.

Por último, e talvez mais importante, aprenda a estabelecer limites para não assumir novas tarefas que não competem a você. Depois do primeiro não, os próximos sempre são mais fáceis. Para a maior parte de nós é fácil deixarmos de lado nossas urgências para atender às necessidades de outras pessoas. Esse é um hábito que precisamos perder, se a leveza está nos nossos planos de vida.

Podemos sim ser gentis, contanto que estejamos com energia e tempo sobrando para aquilo, e que vamos poder prestar a ajuda sem que ela nos custe.

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